Empresas discutem efeitos da vacinação

17/06 – Fonte: Jornal Valor Econômico – Pág.: B7

 

Empresas do mercado de consumo – de varejistas a fabricantes de eletrodomésticos – estão numa intensa discussão sobre os efeitos do aumento da vacinação sobre os negócios. Há consenso de que a retomada nos negócios não será uniforme. A inflação dos preços dos insumos pode adiar uma expansão mais forte de certos segmentos, beneficiados no ano passado, como os eletroeletrônicos.

“Estamos debatendo agora, em grupos e reuniões virtuais, para buscar mais dados e entender esse movimento. Está certo que a previsibilidade maior, com o avanço da vacinação, gera uma confiança na retomada econômica. Quem se manteve empregado vê que a economia começa a andar e decide voltar a gastar um pouco mais”, diz André Friedheim, presidente da Associação Brasileira de Franchising (ABF). “Os setores não essenciais, como moda e alimentação fora de casa, que foram muito afetados pela crise, agora devem ganhar terreno sobre outros, que foram bem em 2020, como o varejo de decoração e construção”.

A Abrasel, associação de bares e restaurantes, já identificou nas últimas semanas um crescimento tanto no tráfego de clientes como no valor do tíquete médio nos segmentos. Desde maio há uma queda de cerca de 40% nas entregas de refeições a domicílio (`delivery`), com compensação dessa retração na venda feita no `salão` dos estabelecimentos – o que reforça a tendência de consumo fora do lar.

“O Dia dos Namorados foi explosivo em vendas de Norte a Sul. A demanda subiu muito, com uma recuperação clara em andamento. Não creio em terceira onda da covid pelo índice de vacinação em crescimento e pelos anúncios de avanço na imunização em praças que, para nós, são fundamentais, como Rio e São Paulo”, diz Paulo Solmucci Jr, presidente da Abrasel.

Ele menciona a existência de um maior nível de confiança da população na economia, o retorno do auxílio emergencial em abril e o maior fluxo de pessoas nas ruas. “O “coronavoucher”, mesmo menor, para nós tem efeito direto na demanda. Quando ele foi suspenso, sentimos na mesma hora. Além disso, ainda há uma demanda reprimida em serviços”, afirma. “Sem viagens internacionais, o consumidor está voltando a viajar dentro do país, e calculamos que cerca de 33% da atividade gerada no turismo beneficia diretamente os bares e restaurantes”.

“Outro termômetro é a ocupação de pontos, e ela já começou a ocorrer no Rio, onde a vacinação também deve aumentar o ritmo. Em São Paulo, essa ocupação está mais lenta, e a demanda nos estabelecimentos anda um pouco mais devagar do que no Rio, mas também há tendência de recuperação mais clara após maio”, afirma ele. A Abrasel projeta um fim de ano “muito bom”, reflexo da projeção de alta de 100% na receita do setor no segundo semestre sobre 2020.

Solmucci Jr lembra, porém, que esses avanços não vão eliminar as perdas do setor desde 2020. No ano passado, a receita do segmento caiu 25%. “Para nos recuperarmos deste tombo serão necessários, pelo menos, dois anos [2021 e 2022]. As empresas ainda não estão alcançando rentabilidade que tinham em 2019 e parte continua endividada por conta da pandemia e isso ainda precisa ser administrado pelas empresas”.

Para a Eletros, a associação nacional dos fabricantes de produtos eletroeletrônicos, há um efeito negativo sobre o setor nos próximos meses, que pode pesar, apesar do cenário de avanço na imunização.

“Tivemos demanda em alta no ano passado, com as pessoas ficando mais em casa e trocando produtos. Mas neste ano, com o isolamento caindo, todos os setores vão disputar o bolso do consumidor e temos um cenário mais difícil. E os aumentos de insumos dolarizados continuam sendo repassados aos fabricantes e ao varejo”, diz José Jorge do Nascimento Jr, presidente da Eletros. Um fabricante contou ao executivo que há novos pedidos de aumento no aço. “De janeiro a julho, a alta é de 95%. A questão é se o consumidor vai absorver isso. Entendemos que há risco de que essa pressão impacte nas vendas”.